Gols de letra com Milton Neves e João Ubaldo. Por Alex Medeiros

Por Alex Medeiros, @alexmedeiros59 / há Out 2014
Comendo em mesas distintas, o crítico de cinema Rubens Ewald Filho, o escritor João Ubaldo Ribeiro e o jornalista esportivo Milton Neves agradaram todas as torcidas e estilos que os procuravam para uma foto, uma conversa, uma assinatura em guardanapo.

Comendo em mesas distintas, o crítico de cinema Rubens Ewald Filho, o escritor João Ubaldo Ribeiro e o jornalista esportivo Milton Neves agradaram todas as torcidas e estilos que os procuravam para uma foto, uma conversa, uma assinatura em guardanapo.

* Foto: Marinho Chagas, o escritor João Ubaldo Ribeiro e Milton Neves, na cidade de Natal em 2010. Marinho, craque da bola e Ubaldo, mestre da pena, partiram para o céu em 2014. 

Os muitos turistas que foram saborear os pratos do restaurante Camarões Potiguar numa certa tarde de sexta-feira, em 2010, na praia de Ponta Negra, em Natal, tiveram um prazer a mais durante o almoço. Um aperitivo diferente em forma de autógrafos de algumas celebridades presentes.

Comendo em mesas distintas, o crítico de cinema Rubens Ewald Filho, o escritor João Ubaldo Ribeiro e o jornalista esportivo Milton Neves agradaram todas as torcidas e estilos que os procuravam para uma foto, uma conversa, uma assinatura em guardanapo.

Tínhamos acabado de comer no primeiro andar da saborosa casa, eu, Milton e mais alguns amigos jornalistas, todos na companhia dos craques Marinho Chagas, Alberí e Danilo Menezes. Quando já íamos embora, avisei da presença de Ewald e Ubaldo.

Eu havia conhecido o ganhador do Prêmio Camões 2008 num final de manhã de 2001, no Rio de Janeiro, quando fui conversar com Armando Nogueira sobre a feitura do seu texto para o livro “Todos Juntos, Vamos – Memórias do Tri”, lançado em 2002 na Livraria Argumento, do Leblon.

Se não era um profundo conhecedor da sua extensa obra literária, sabia ao menos de uma parte importante da sua vida, quando em Natal reencontrou uma namorada de infância e voltou com ela para Salvador, deixando aqui o marido dela, Henfil, traçando estudantes nos passeios praianos com um buggy do empresário Fernando Bezerra.

No percurso entre o primeiro andar e o térreo do restaurante, chamei a atenção de Milton Neves para a mesa de Rubens Ewald Filho, que almoçava com um amigo; mais à frente, na área de fumantes, avistei João Ubaldo e fomos lá cumprimentá-lo.

O crítico de cinema veio a Natal participar do Festival de Cinema que há anos acontece na cidade, ideia do seu colega de profissão Valério Andrade; o escritor era uma das personalidades principais da Feira Literária de Pipa; e o Neves tinha chegado para emular a torcida do ABC na série C e visitar a Band local.

Com seu conhecido estilo de pesquisador de arqueologia ludopédica, Milton Neves circulou entre as mesas sempre acompanhado do três maiores craques do futebol potiguar, Marinho Chagas, Alberi e Danilo, todos ícones do ABC nos anos 1970.

O apresentador da Band, obviamente bem mais expansivo que os outros célebres visitantes, agitou o restaurante indo ao encontro deles, de certa forma estimulando muitos turistas a assediarem depois o craque do cinema e o artilheiro das letras.

Admirador explícito do futebol que jogou Marinho Chagas nos gramados do Brasil e do mundo, Neves aproveitou os bate-papos com Ewald Filho e João Ubaldo para louvar a figura do agora saudoso gênio natalense que virou marca do Botafogo e lenda da Copa de 1974.

“Ô Rubens Ewald, você precisa conhecer esse cara aqui, um mito do futebol nacional, o Garrincha de Natal”, soltou a voz generosa por todo o ambiente de comensais curiosos. “Grande João Ubaldo, escreva um livro sobre o Marinho, rapaz”, provocou, observado por Berenice, a mulher do baiano.

A fama da “Bruxa”, apelido incorporado a Marinho no auge da carreira, é tão latente que mesmo um intelectual sem qualquer envolvimento com futebol, como o cinéfilo, registrou um frame de reconhecimento. “Lembro, Marinho do Fluminense, né?”, arriscou.

Já o marido de Berenice Batella, tão conhecedor do “povo brasileiro”, torcedor fanático do Vitória, não escondeu a admiração pelo ex-lateral que conquistou a Alemanha na primeira Copa da seleção sem Pelé. Ubaldo tirou fotos com a “bomba do Nordeste”.

Depois das fotos, um diálogo próprio de arquibancada, uma sequência de provocações entre o jornalista esportivo e o escritor, que arrancou gargalhadas no recinto. Começou com Neves informando que iria para Salvador, terra dos times do Bahia e do Vitória.

Rubronegro quase xiita, Ubaldo foi logo se assumindo: “Você sabe que eu sou Vitória, mas gosto muito do Bahia, afinal sem ele o rubronegro não acumularia glórias, precisamos dele para construir nossas vitórias e alegrias, né?”. Milton é Bahia.

O homem do Terceiro Tempo começou o lúdico quiproquó: “Mas, no geral, vocês perdem para o Bahia até em concurso de miss, como aconteceu outro dia, rapaz!”. O autor de Sargento Getúlio baixou o cacetete das palavras: “Não agrida senão te chamo de Galvão Bueno...”

Virando-se para a mulher, sua cúmplice há trinta anos, Ubaldo continuou: “Olha, meu amor, deixa eu te apresentar aquele famoso locutor de futebol, o Galvão Bueno”. No barulho das gargalhadas dos clientes da casa, Neves armou o contra-ataque.

“Minha senhora, não agirei como ele, no desaforo; me despeço do seu marido dizendo assim, tchau Jorge Amado!”. Mais gargalhadas e o escritor chuta: “Puta que o pariu, tu é mais demagogo ao vivo do que na TV”. Ao lado, Alberí, Danilo e Marinho Chagas numa escancarada tabelinha de risos.

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