TV Globo-RJ

O início da carreira...
Paula Vares Valentim
jornalista responsável

Revelado pela imprensa através de Telmo Zanini, o atual diretor responsável pela programação de futebol da TV Globo, Chico Santo apareceu no cenário esportivo pela primeira vez durante o amistoso que marcou a volta de Ronaldo Nazário aos gramados no confronto entre as seleções nacionais de Brasil e Iugoslávia, em 27 de março de 2002, no Estádio Castelão, em Fortaleza. O duelo, o último antes do embarque da Seleção Brasileira para a Copa do Mundo de 2002, definiu a lista dos 23 atletas relacionados para o pentacampeonato mundial da Coreia / Japão e fez com que o então desconhecido estudante de jornalismo ganhasse evidência nos bastidores. Aquele era, sem dúvida, um jogo especial. Não tanto pelo peso de um amistoso oficial da FIFA, mas, sim, pelo tumultuado clima de bastidores preponderado em um ambiente incerto e cheio de mistérios que fazia daquela uma partida diferente. Para começar, nem mesmo o próprio Felipão, com o dedo do Milton Neves, era capaz de dizer se estaria com o cargo de treinador no mundial. Àquela altura, diante dos péssimos resultados obtidos nas Eliminatórias Sul-Americanas, a cabeça de Scolari estava na imperdoável mira da opinião pública e também da Confederação Brasileira de Futebol. Em outras palavras, havia dúvidas se de fato Luis Felipe Scolari seria o responsável pela convocação de um dos times mais cobrados de todo o planeta. Ademais, mesmo que o treinador permanecesse no cargo, como a história se encarregaria de provar nas páginas do esporte, as dúvidas também se faziam presente em relação à lista de convocados que viria a ser divulgada. Romário era o nome do momento. Na imprensa não havia quem confirmasse se ele estaria ou não no time do penta. Luis Felipe Scolari não queria. Comprara uma briga com todo o Brasil e se mostrava irredutível em sua decisão. Por outro lado, indiferente a participação do atleta em um amistoso caça-níquel do Vasco, quando Felipão dirigia a Seleção Brasileira na Copa América da Colômbia, um ano antes, praticamente todos os torcedores do país saiam em defesa do atacante responsável pela conquista do tetra nos Estados Unidos. A falta de comprometimento de Romário com o Brasil, no momento em que recusou a camisa 11 da Seleção, em 2001, provocou, nos meses subseqüentes, o corte da seleção.  Em nada adiantaram o apelo e choro do atleta aos microfones do Rio de Janeiro. E, se não bastasse a briga com Romário e praticamente todos os torcedores do país, Luis Felipe Scolari arrumaria mais um problema diante de suas convicções. Bancar o retorno de Ronaldo Nazário aos campos depois da lesão no joelho esquerdo sofrida na Europa apimentava ainda mais a partida. O Fenômeno sequer havia jogado pela Internazionale de Milão. Então, a convocação de Ronaldo para o último amistoso da Seleção Brasileira antes do embarque rumo ao penta deixou a CBF mal vista diante do departamento médico e administrativo da Inter. Havia, acima de tudo, o receio por parte do clube milanês de que uma nova contusão pudesse afetar a carreira e consequentemente a volta da mais cobiçado jogador do mundo. Indiscutivelmente, tudo isso mexia com os bastidores da Seleção Brasileira quando eu sequer fazia parte da imprensa esportiva. Na época, iniciava o terceiro ano de jornalismo. Tinha apenas 22 anos mas entendia que faculdade nenhuma me arrumaria o emprego dos sonhos. O tempo se passava e a pressão em busca de algo na área aumentava. Mais do que tudo na vida, eu queria ser repórter. Já havia tido bons contatos dentro da imprensa e trilhava alguma coisa junto ao saudoso Marco Antonio Uchoa, no Fantástico. Entretanto, por mais próximo que eu pudesse estar, a realidade era dura: atuava como estagiário na Dersa e a cada novo dia o sonho de entrar na imprensa em um primeiro passo antes de me tornar repórter parecia gradativamente mais longe. Foi quando embarquei para Fortaleza."
A viagem que marcou a entrada de Chico Santo na imprensa se deve ao que o repórter considera o milagre da multiplicação das milhas. Como tudo na minha vida, foi Deus. Só não enxerga quem não quer. Eu não tinha dinheiro para nada, sequer podia pagar as diárias do Marina Park Hotel, quanto mais subir em um avião. Foi quando Deus, como sempre, apareceu. Ganhei 4 passagens da VASP, para voar para qualquer lugar do Brasil, depois de pagar um jantar a um colega que não tinha vale. Ele me disse que não poderia me pagar e eu completei: relaxa, Deus me paga. Algum tempo depois ele me ligou dizendo que tinha comprado o meu convite para uma festa da VASP, no hangar em Congonhas, com pilotos e comissárias. Foi ele quem me deu o ingresso premiado. Os números do canhoto me renderam 4 passagens de brinde. Desci e disse a ele: lembra daquele jantar? Deus já me pagou. Guardei as passagens e esperei o momento certo para utilizá-las. Quando ouvi o Galvão Bueno anunciando na TV Globo que Ronaldo Nazário voltaria aos gramados, então, não tive dúvida de que aquele era o momento de usar o premido. Liguei para um primo, empresário, e disse que a gente poderia ir para o jogo. Eu entrei com as passagens e ele com a diária do hotel. Na capital do Ceará, dentro do Estádio Castelão, o repórter apareceu para o mundo.

Com os bolsos vazios, característica que o perseguiu durante boa parte da vida, o então estudante precisou fazer o inusitado para não passar fome. Diante do melhor café da manhã que teve durante muitos anos, aproveitou a fartura do banquete matinal para abastecer o apartamento que dormia ao lado da concentração da Seleção Brasileira. Uma maneira gratuita de evitar que a barriga roncasse. "Os seguranças ficavam olhando e eu dizia que estava levando a comida para a minha namorada. Só que todo mundo sabia que eu era solteiro e que aquela era apenas uma alternativa inteligente para abastecer a geladeira do quarto e evitar gastos com o restaurante do hotel. Uma situação curiosa se tratando de um 5 estrelas... De qualquer forma, lá, na sala do café da manhã, conheci o Mauro Naves Ele estava com um prato de frutas na mão quando me apresentei. Perguntei a ele como faria para conseguir uma entrevista com algum personagem da Seleção Brasileira. Na verdade, eu sequer tinha um veículo. Inventei que precisava fazer um trabalho para universidade e que tinha que chegar em algum jogador. Educado, como de fato é, o Mauro me disse que seria difícil porque eu não estava credenciado. A melhor maneira seria ficar de olho no saguão do hotel e torcer para que alguém descesse, o que parecia improvável.?
O destino do repórter só começou a mudar na véspera do amistoso. "Eu não dormia, ficava o tempo todo no saguão do hotel. Conversava com jornalistas e fazia contatos. No dia em que o Brasil fez o treinamento de definição do jogo, vi o Felipão na piscina, tomando água de coco com alguns diretores de jornalismo que ? até então - eu não conhecia. Por lá, fora da mesa, estavam os experientes repórteres Fernando Fernandes, Mauro Naves e Roberto Tomé. Só tinha fera. Todos do lado de fora da mesa, a espera de um momento oportuno. Havia, apenas, uma cadeira desocupada. Justamente a que o Luís Felipe Scolari tinha deixado os seus materiais esportivos. Não tive outra escolha. Passei uma boa dose de óleo de peroba na cara, cheguei perto do Felipão, lhe dei um tapa nas costas e perguntei se poderia me sentar ao seu lado. Ele me deu aquela olhada de ´não te conheço guri´, mas foi elegante e me liberou o espaço.?
Tão logo se levantou, ao fim do bate-papo, Chico Santo foi chamado de canto para uma conversa reservada com a segurança do hotel... "Os caras eram mal encarados. Tinha um com 3 metros de altura. Em síntese, leram os meus direitos. E, como inquilino, não como jornalista credenciado, eu não podia andar ao lado da Seleção Brasileira e da imprensa. Caso desrespeitasse a ordem seria obrigado a fechar a conta, pagar o hotel e sumir?. Justamente o que mais temia ouvir. "Aquela era a minha chance. Eu não poderia me dar ao luxo de embarcar para um novo projeto como o que estava fazendo. Custava caro, para mim. Se não desse certo voltaria para São Paulo como um derrotado. Fiquei triste pela situação e comecei a chorar na sala da assessoria de imprensa do Marina Park Hotel. Eu era apenas um garoto de 22 anos. Foi aí que o senhor de cabelos grisalhos que também estava na mesa, durante a conversa com o Felipão, me disse para ficar tranqüilo. Ele sabia que eu era um estudante de jornalismo que estava apenas um passo além dos demais. Então, pediu-me para que eu o encontrasse em 15 minutos no saguão do hotel para que eu pudesse ter a minha credencial de acesso.?
Desacreditado, o que Chico Santo não sabia era que o homem de cabelos brancos que o havia socorrido nada mais era do que o diretor de esportes da TV Globo-RJ. "Como estudante, eu deveria, mas, reconheço, não conhecia o Telmo Zanini. Sei que ele me arrumou uma credencial que me deu acesso ao treinamento e jogo, como se eu fosse membro da imprensa. Foi o meu primeiro estágio na área, com a TV Globo, o sonho de cobiça de qualquer estudante que se projeta ao futuro sem medo. Eu não tinha dinheiro nem para tirar a fotografia do documento. Precisei cortar a minha carteirinha da biblioteca da universidade. Depois disso, todo mundo começou a falar de mim. Entrei em evidência. Entrevistei vários jogadores. Tive acesso as áreas que só a Globo podia entrar. Lembro do Bussunda conversando com o Ronaldo Nazário e o Kaká. Participei daquele histórico encontro. Fui de carona para o estádio com o fotógrafo Carlos Morais que trabalhava no Jornal O Dia e Zero Hora. Após o treinamento, no momento de voltar para o hotel, sem dinheiro para o táxi, me apresentei ao Wanderley Nogueira, da Jovem Pan, como futuro aluno do Flavio Prado, e lhe pedi uma carona. O Wanderley olhou para o Choquito e disse que sim. Ao voltar a São Paulo, menos de uma semana depois, fui convidado para atuar como produtor de esportes da emissora e coordenador do Pique da Pan ao lado do Felipe Motta Alves e Fredy Júnior. A TV Globo, que muita gente mete o pau, sem saber o que se passa nos bastidores, foi quem me abriu as portas da imprensa. Sou muito grato por isso. O que o Telmo Zanini fez por mim poucas pessoas até hoje fizeram.?

Mais do que um contato profissional, Telmo Zanini tornou-se um exemplo de conduta para Chico Santo. "Troco muitos e-mails com ele. Jamais deixamos de nos falar. Ele me ajudou muito e quando algum estudante me procura sempre me lembro do que ele fez comigo. Em 2009, coincidentemente, embarcamos juntos para a Copa das Confederações da África do Sul. Tive a honra de viajar no mesmo avião que ele. Lembro-me de tê-lo encontrado no saguão do Aeroporto Internacional de Guarulhos, na fila da South Africa Airways. Para mim aquilo foi o máximo. Ouvir da boca do senhor que me abriu as portas da imprensa que ?eu estava em todas as coberturas? era como ter a certeza de que ? de alguma forma, ainda que aos trancos e barrancos -, eu estava vencendo. No Tocantins, quando ainda trabalhava na TV Anhanguera, afiliada da Globo, ele me escreveu um e-mail que me emocionou muito. Na época, em poucas palavras, disse que eu era um ´guerreiro incansável.´ Jamais me esqueci dessa expressão.?
ver mais notícias

Selecione a letra para o filtro

ÚLTIMOS CRAQUES