Os brasileiros estão de volta

Chico Santo, Bastidores da Copa do Mundo

Paula Vares Valentim
jornalista responsável

Parece exagero, mas não significa que não aconteceu. Há menos de 24 horas para a estréia da Seleção Nacional do Brasil na Copa do Mundo, a antítese, definitivamente, toma conta da rotina dos torcedores brasileiros. Se por um lado, a alegria e o espírito de receptividade sul-africana, indiscutivelmente, predominam nos bastidores do mundial, é inevitável dizer, em contrapartida, que a insegurança e o medo encabeçam a lista das precauções sublinhadas no manual de sobrevivência da África do Sul. "A coisa aqui é séria. Eu mesmo passei por um momento constrangedor durante a festa de abertura da Copa do Mundo, em Soweto?, afirma o paulista Ostálio Murador. Depois de pagar antecipado por um serviço exclusivo de transporte, o torcedor teve que esperar pela boa vontade do seu motorista. "Ele deveria estar à disposição, mas ao invés disso ficou pegando mais pessoas lá para levar para casa e aumentar o faturamento. Fiquei duas horas perdido, esperando o cara e eu não podia falar nada. Ligava para ele e ouvia estou chegando, estou chegando. E nunca chegava?. Sem ter o que fazer, diante da falta de profissionalismo do próprio motorista, Ostálio Murador se viu obrigado a respirar fundo e engolir o sapo. "Se eu brigo e ele me deixa pra trás eu estava ferrado. Tive que ficar quieto e voltar no carro que aluguei com exclusividade com outras seis pessoas além das quatro que já haviam. Só pra você ter idéia, o motorista ainda deixou cada um dos passageiros em sua casa para depois me levar por último ao hotel?, contou. Situação parecida viveu Gabriel Gameiro. Enquanto esperava pela chegada da van, o jovem não só foi roubado, como também ficou amigo do próprio ladrão. "Ele pegou todo o dinheiro, mas como era bom coração, devolveu os documentos?, orgulha-se Gameiro. Após o incidente, o morador de Santo André não tem dúvidas: "Os ladrões aqui são bonzinhos. Dá até pra fazer amizade com os bandidos. Eles são gente boa?, ironiza. Para José Paulo Maldonado Faria, no entanto, o problema foi ainda maior. "Fiquei duas noites trancado no banheiro?, diz o aposentado. "O único incidente que me aconteceu foi pior do que tudo que poderia ter ocorrido. Peguei uma dor de barriga do caramba e não conseguia nem andar?, explica. O motivo? Bem... a tal da pimenta que anda tirando o sabor do cachorro quente de muita gente:  "A comida aqui é realmente forte. Eles colocam muita pimenta. Tem que ficar ligeiro. O primeiro dia, se você bobear se dá mal. É sério. Toma cuidado. Já perdi duas cuecas aqui,? relata o homem do destempero intestinal. Apesar disso, seja por algum desarranjo natural ou pelo reflexo de um país marcado pela violência, quando o assunto é Brasil na Copa, qualquer problema que possa parecer desagradável fica para trás e se perde diante do bom humor e da criatividade verde-amarela. "Dá para dizer que o sul-africano é um povo bem alegre. Tudo é festa. Está tudo muito bom para eles?, diz o comerciante Sebastião Gonçalves "Parece um pouco com o Brasil. Tirando os incidentes, o pessoal é receptivo, faz festa e pede autógrafo. Acho que a Seleção vai se dar bem. Tomara, é a minha primeira Copa. O Brasil tem que ir bem ou o pessoal vai me chamar de pé frio?, complementa o carioca Leandro Rangel Sardinha.

Pelas ruas de Johanesburgo, na capital financeira da África do Sul, há também quem troque o toque de bola por um esporte com um pouco mais de adrenalina. "Eu trouxe o skate porque eu gosto muito e vi pela internet que há várias pistas legais por aqui. É uma diversão a mais?, diz o estudante Rafael Murador, de São Bernardo do Campo. "Viemos pela Copa, mas não vamos perder a viagem. Pode faltar roupa, pode faltar breja, mas o Skate tem que vir?, acrescenta o companheiro de rampas da Avenida Paulista, Murilo Cretucci.
Desinformados, sobretudo em virtude do fechamento dos treinos da Seleção Brasileira, em razão, também, do desentendimento de alguns jogadores do elenco e da apatia do técnico Dunga com a imprensa nacional, os torcedores canarinhos bancam nas ruas o papel do porta-voz do auxiliar Jorginho diante da pergunta que mais se ouve na África do Sul. "Todos querem saber: E o Ronaldinho? Eu falo que ele está tomando cerveja lá no Brasil. O que você pode esperar dele e do Adriano? São profissionais que deixam tudo pra lá. Estão no lugar certo. Esperando. Batendo palma em frente a televisão. Nem para cá podem vir?, afirma o comerciante Luis Carlos Cretuci.

Ao contrário do que acontece com a Argentina de Diego Armando Maradona e Lionnel Messi, tidos ao lado de Cristiano Ronaldo como a sensação do mundial, os torcedores brasileiros sequer são autorizados a chegar perto da concentração do nada simpático Dunga. O resultado disso é claro. Enquanto os argentinos fazem a festa nas arquibancadas durante os treinos e assistem inclusive aos gols do técnico Maradona, os brasileiros deixam de viver o presente para explicar o que para os sul-africanos é tido como um grande erro de Dunga. "O Ronaldinho Gaúcho já fez a parte dele. Teve a oportunidade. Se não aproveitou, então, agora, bate palma?, complementa Cretucci.  
Nesta terça-feira, pela primeira vez, desde que desembarcou na África do Sul, a torcida brasileira finalmente vai poder conferir o time de Dunga. Antes da estréia, no entanto, a Seleção Nacional do Brasil faz um treino de reconhecimento de gramado no Estádio Ellis Park, aberto a imprensa. Por determinação da FIFA e seus patrocinadores, desta vez, Dunga não vai poder vetar o trabalho dos jornalistas. A torcida é para que o mistério do treinador seja revertido em uma boa atuação contra a fraca Coréia, a exemplo do que ocorreu com a não nazista Alemanha e a democrática Argentina.

 

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