O Deus de Kaká

Chico Santo, bastidores da Copa do Mundo-2010

Paula Vares Valentim
jornalista responsável

Chico Santo, direto da África do Sul - O velho ditado diz: "política, religião e futebol não se discute.? Na teoria, em algumas partes do mundo, é assim. Ou, durante algum tempo, foi. Pelo menos, é o que ainda se ouve, da boca do povo, no Brasil. Mas na África do Sul, no entanto, a regra parece fugir à exceção.  Não poderia ser diferente se tratando de um mundial escolhido mais pelos laços de afinidade e reconhecimento a Nelson Mandela do que propriamente pelas questões de relevância esportiva. Algo tão comum quanto a mistificação da fé dentro dos bastidores da FIFA por um dos principais jogadores da atualidade do futebol. "Ei, por favor, pegue um CD?, diz uma mulher ? que não se identifica - em tom convidativo com um largo sorriso em frente a porta de entrada do FIFA Fest Fun de Pretória. A obra dada de forma discreta, porém absolutamente as claras de quem passa pelo local, desperta a atenção. Contém, através de mensagens cristãs, a biografia do camisa 10 da seleção mais cobiçada do planeta. Trata-se de Kaká. Talvez, o primeiro grande craque brasileiro disposto a comprar uma briga com a FIFA, em plena Copa do Mundo, para mostrar a quem quer que seja um pouco de sua crença religiosa. "Feche os olhos, abra o seu coração. Seja objetivo. Acredite em Deus. Realize seus sonhos?, diz o meia brasileiro na abertura do documentário. O DVD é mais uma polêmica que se sustenta no mundial de 2010 em relação a utilização da fé dentro do esporte. Com cópias em português, grego, italiano, holandês, alemão, francês, russo, árabe, japonês, chinês, espanhol e inglês, o atleta conta um pouco de sua história enfatizando, sempre, a presença de Deus em sua vida. "Meu nome é Ricardo Kaká e este é o ritmo do meu jogo. Nasci em Brasília no dia 22 de abril de 1982 e fiquei por lá até os 4 anos de idade, antes de me mudar para Cuiabá?. O contexto bíblico, esboçado entre um em outro grande lance, aparece de forma explicita. Em meio aos versículos, o craque relembra o passado afim de prender a atenção de seus fãs através do paradigma esporte-religioso. "A primeira lembrança que eu tenho de futebol foi quando eu tinha sete anos e morava em Cuiabá ainda. Minha mãe me levou para uma universidade e eu entrei para jogar com crianças muito maiores do que eu naquela época e acabei me destacando no meio deles.? O CD é visto entre os dedos de fãs de todo o mundo. O título resgata momentos preciosos da infância do atleta e conta detalhes da vida pessoal de Kaká. "Diferente de muitos outros jogadores que vem de família humilde, que vem de favela, eu tive a oportunidade de vir de uma família de classe média. Meu irmão é três anos mais novo que eu e eu fui sempre aquele irmão que cuidava. Sempre fizemos tudo juntos?, diz.
Coincidência ou não, foi também através de seu irmão que por acaso o nome Ricardo se tornou mais simples e compreendido no mundo da bola. "A verdadeira história do meu apelido é que quando eu era pequeno meu irmão não conseguia falar Ricardo. Ele não conseguia falar o meu nome. Ele me chamava só de Kaká. Kaká, hoje, é fruto do meu querido irmão que não sabia falar o meu nome quando a gente era criança?, conta. Vestido, algumas vezes com roupas de seus patrocinadores esportivos que levam as cores do Milan e Real Madri, dentro dos campos em que muitas vezes brilhou, Kaká explica como o futebol surgiu em sua vida. "A gente botava um colchão na sala de casa. Um ia no gol, que ficava defendendo no colchão, o outro era o atacante. Pegava a bolinha de tênis jogava na parede, a bolinha voltava e tentava fazer o gol?.
Anos mais tarde, no entanto, o jogador percebeu que poderia viver do futebol. "Durante as aulas de educação física no colégio o professor viu que eu me destacava entre os alunos. Ele chamou a minha mãe e disse `olha eu aconselho a senhora colocar o seu filho numa escolinha de futebol porque ele tem um talento diferenciado`?. A vídeo-reportagem distribuída gratuitamente na África do Sul mostra um Kaká saudosista, religioso, seguidor de seus ideais e vitorioso. "Os momentos mais especiais da minha carreira, foram, claro, as minhas conquistas. Desde a Copa de 2002 quando eu tinha 20 anos e fui campeão mundial com a Seleção Brasileira na Coréia e no Japão. Foi realmente algo sobrenatural, um presente de Deus na minha vida e pra minha carreira. E ao longo da minha carreira eu tive várias outras conquistas chegando até o ano de 2007 que foi o ano onde eu acabei conquistando as coisas mais importantes individualmente e coletivamente quando nós fomos campeões com o Milan da Liga dos Campeões, campeão do Mundo de clubes, campeão da Supercopa Européia. Eu acabei sendo bola de ouro, prêmio super renomado no meio do futebol e no final a coroação com o prêmio de melhor jogador do ano pela FIFA.?
Quando questionado por sua produção em relação aos momentos de dificuldades vividos ao longo de sua carreira, o jogador aponta Deus como o grande responsável pela superação dos obstáculos. Alguns deles, como a fratura do pescoço em uma piscina poderiam ter colocado um ponto final de forma traumática em sua vida. Outros mostram que até mesmo as situações mais difíceis podem ser dribladas, segundo Kaká, quando se tem fé. "Eu tinha um grande problema físico quando eu era criança. Eu tinha dois anos de atraso na minha idade óssea. Ou seja, quando eu tinha 14 anos eu tinha o físico de 12?.
Saudosista, o meia brasileiro, relembra tempos de São Paulo. "Comecei minha carreira com o São Paulo em 2001. Meu primeiro jogo como profissional foi em janeiro, um jogo contra o Botafogo pelo torneio Rio-São Paulo. Não a famosa final que eu acabei fazendo dois gols. Mas um jogo antes que foi no meio de semana, 1 a 1 no Estádio do Morumbi . Em agosto de 2003 eu fui vendido do São Paulo pro Milan, onde começou a minha história na Itália num dos maiores clubes do mundo e foi uma passagem de seis anos.? Depois de ganhar tudo com o Milan, Kaká revela detalhes importantes sobre sua transferência para a Espanha. "Em 2009 minha história com o Milan terminou. Fui vendido do Milan pro Real Madri por um valor realmente alto. Acho que isso é uma honra de Deus porque é uma gratificação que vem de Deus e acabei sendo a terceira maior negociação na história do futebol.?
Sempre procurando mesclar um pouco da fé com sua vitoriosa carreira, Kaká se diz feliz em jogar pela Seleção Brasileira. Algo muito além do que um dia pensou. "Quando eu era criança eu tinha o sonho de vestir a camisa da Seleção Brasileira uma única vez. Uma vez só na minha vida. A bíblia fala que Deus dá muito mais daquilo que nós pedimos ou pensamos. Deu a oportunidade de ser campeão mundial em 2002 e disputar uma outra Copa em 2006. Fazer parte da Seleção Brasileira é algo especial porque quando você veste a camisa da Seleção do seu país você se sente muito defensor da sua pátria.? Em meio às questões que envolvem o sexo e as doutrinas religiosas, Kaká deixa também a sua opinião. "Conheci a Caroline da forma como foi, uma grande benção de Deus. Em dezembro de 2005 nos casamos de uma maneira também muito especial porque nós dois chegamos virgens até o casamento e isso para nós foi uma grande benção porque hoje em dia é muito difícil fazer isso. Você é visto com um certo preconceito.?
O documentário de cerca de uma hora foi produzido com imagens do Brasil e da Europa. Indiscutivelmente, transmite uma mensagem bíblica para o mundo. Uma postura corajosa para quem luta contra o preconceito extra-campo, sobretudo, diante daqueles que questionam a fé do atleta, bem como a maneira que trabalha com a crença, dentro e fora do gramado. "A forma que eu lido com as pessoas que não acreditam em Jesus ou que muitas vezes criticam a minha fé da minha forma de viver é simplesmente com respeito. Então, eu acho que isso faz toda a diferença porque cada um tem uma idéia, cada um tem um pensamento, cada um tem a sua maneira de viver, de pensar, de ter experiências. Então, eu não critico ninguém e também, da mesma forma, eu gosto que as pessoas respeitem quais são as minhas convicções, quais são as minhas verdades, quais são as coisas que eu passo e vivo porque eu não conto historinha?. Um recado dado, em outras palavras, aos mais nobres ateus.

 

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