por Marcos Júnior
Possivelmente o mais dramático campeonato de Fórmula 1 desde 1950, o ano de 1976 só conheceu seu campeão após uma corrida emocionante, a última da temporada, no Japão, no circuito de Monte Fuji.
O inglês James Hunt, com a McLaren utilizada por Emerson Fittipaldi na temporada anterior, quando o brasileiro foi vice-campeão, conseguiu se recuperar na temporada após o gravíssimo acidente sofrido pelo favorito ao bicampeonato, o austríaco Niki Lauda, da Ferrari, em Nurburgring, na Alemanha.
A Ferrari de Lauda incendiou-se e ele ficou preso às ferragens por vários minutos. Com queimaduras de primeiro grau, chegou a receber a extrema-unção de um padre no hospital. Segundo o próprio Lauda, ele ouvia tudo o que falavam ao seu redor durante os primeiros dias de internação, quando todos pensavam que ele estivesse inconsciente.
As sequelas foram profundas em seu rosto, que ficou desfigurado, mesmo após diversas cirurgias plásticas. Sua orelha direita foi praticamente toda consumida pelo fogo e parcialmente reconstituída.
Hunt aproveitou para reduzir a diferença no campeonato. Até o acidente de Lauda, o placar era 61 para o austríaco da Ferrari e 26 para o inglês Hunt, da McLaren. O título para o time de Maranello parecia barbada.
O inglês tirou toda a diferença que pôde enquanto Lauda esteve fora de combate, e alinhou sua McLaren em Monte Fuji com três pontos a menos que o ferrarista.
Resumo: a largada foi adiada por mais de duas horas devido à chuva torrencial que caía em Shizuoka. Vencidos pelos interesses dos patrocinadores, os pilotos entraram em suas "cadeiras elétricas", e foram à luta.
Lauda, cauteloso, deixou um batalhão ultrapassá-lo e em seguida encostou seu carro escarlate nos boxes.
O time de Maranello justificou, em nota, "problemas mecânicos" para o abandono de seu campeão.
Lauda rebateu, depois, alegando outro motivo, bem mais humano:
"A Ferrari me paga para correr, não para me jogar da janela", disse o austríaco.
Tudo transcorria a favor de Hunt sem o rival na pista. Após ter liderado por bastante tempo, ele estava em terceiro na prova, atrás de Depailler e Andretti, colocação que lhe renderia quatro pontos pelo sistema antigo da F1, quando Depailler foi para os boxes trocar pneus, e o trabalho foi mais demorado, pois ele corria com a folclórica Tyrrell P-34, aquela de seis rodas.
Hunt ainda sofreu um ataque impetuoso do italiano Vittorio Brambilla, que quase bateu em sua McLaren em tentativa frustrada de ultrapassagem, com a linda March laranja número 9.
O inglês, então, subira para segundo, agora fazendo seis pontos, mas o inesperado aconteceu, quando o pneu dianteiro esquerdo de seu carro estourou pouco antes da reta dos boxes.
Com o coração na boca, o inglês entrou para uma troca não planejada e, após trinta eternos segundos, foi devolvido à pista na quinta colocação, atrás de Mário Andretti, Patrick Depailler, Clay Regazzoni e Alan Jones. Em quinto lugar, Hunt marcaria apenas dois pontos, lembrando que ele precisava de três para sagrar-se campeão.
Hunt partiu para o tudo ou nada nas voltas finais. Regazzoni, com problemas nos pneus, caiu várias posições, mas a falta de comunicação de pilotos e boxes não permitiu que Hunt soubesse que já era o quarto colocado e virtualmente o campeão.
Encostou na Surtees de Alan Jones e, na última volta, arriscou tudo na ultrapassagem sobre o australiano, pensando ser o quarto ao conseguir a manobra, quando na realidade já era o terceiro, pontuação que lhe garantia o título.
No final, Hunt terminou o ano com seis vitórias (Espanha, França, Alemanha, Holanda, Canadá e Estados Unidos-Leste), contra cinco de Lauda (Brasil, África do Sul, Bélgica, Mônaco e Inglaterra).
O ano de 1976 também marcou o primeiro dos cinco em que Emerson Fittipaldi competiu por sua própria equipe, a Fittipaldi. Sem chances de lutar por vitórias, ainda sim o bicampeão conseguiu três sextos lugares naquele ano.
O Mundial também contou com a estreia da equipe francesa Ligier, com seu carro azul e branco impulsionado pelo motor igualmente francês da Matra, de 12 cilindros. Na primeira corrida da equipe "Bleu de France" o carro 26 utilizou uma enorme tomada de ar estampando o desenho da cigana, símbolo dos cigarros Gitanes, muito mais pelo apelo publicitário do que por eficiência mecânica e, muito menos, aerodinâmica.
Na equipe quase 100% francesa, seu único piloto, o francês Jacques Laffite fez um belo campeonato, terminando na sétima colocação, subindo ao pódio em três corridas: Bélgica (Zolder), Áustria (Zeltweg) e Itália (Monza).
Foi um ano marcante também para o britânico John Watson, que venceu pela primeira vez na F1, no GP da Áustria disputado em Österreichring. Watson, que viria a ganhar outros quatro GPs na categoria, também foi o responsável pela única vitória da Penske na Fórmula 1, equipe que se notabilizou sobretudo nos Estados Unidos, na Fórmula Indy, fundada por Roger Penske.
Se a Ferrari lamentou a perda do título de Lauda, por outro lado comemorou a Taça de Construtores, superando a rival McLaren por 11 pontos.
Com uma dupla bem equilibrada (o sul-africano Jody Schecketer e o francês Patrick Depailler), a Tyrrel, que utilizou o inovador modelo de seis rodas, o P34 (que venceu o GP da Suécia, com Scheckter), ficou na terceira colocação, seguida por Lotus, Ligier, Penske, March, Shadow, Brabham, Surtees, Fittipaldi, Ensign e Parnelli.

Fotos: Divulgação
Os vencedores  das provas na temporada de 1976 da Fórmula 1:

GP do Brasil (Interlagos) - Niki Lauda (Ferrari)
GP da África do Sul (Kyalami) - Niki Lauda (Ferrari)
GP dos EUA/Oeste (Long Beach) - Clay Regazzoni (Ferrari)
GP da Espanha (Jarama) - James Hunt (McLaren-Ford)
GP da Bélgica (Zolder) - Niki Lauda (Ferrari)
GP de Mônaco (Monte Carlo) - Niki Lauda (Ferrari)
GP da Suécia (Anderstop) - Jody Scheckter (Tyrrell-Ford)
GP da França (Le Castellet) - James Hunt (McLaren-Ford)
GP da Inglaterra (Brands Hatch) - Niki Lauda (Ferrari)
GP da Alemanha (Nurburgring) - James Hunt (McLaren-Ford)
GP da Áustria (Österreichring) - John Watson (Penske-Ford)
GP da Holanda (Zandvoort) - James Hunt (McLaren-Ford)
GP da Itália (Monza) - Ronnie Peterson (March-Ford)
GP do Canadá (Mosport) - James Hunt (McLaren-Ford)
GP dos Estados Unidos (Watkins Glen) - James Hunt (McLaren-Ford)
GP do Japão (Monte Fuji) - Mario Andretti (Lotus-Ford)

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