Chico Santo, Escandinávia

Na rota do Conde Drácula
Paula Vares Valentim
jornalista responsável
A viagem pela Europa durou bem mais do que uma semana. "Eram para ser oito dias. Foram quase dois meses.? Da cobertura do amistoso da Seleção Brasileira na Estônia, Chico Santo entrou no chamado banho cultural. "O Amyr Klink, que conhece um pouquinho do mundo, costuma dizer que `um homem precisa viajar por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou tv`. Ele diz que `precisa viajar por si, com seus olhos e pés para entender o que é seu, para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar do calor ? e o oposto. Sentir a distância`. Se o Amyr Klink fala isso, quem sou eu para dizer o contrário? A gente tem, apenas, que tentar aprender com os mestres. Mesmo que muitas vezes os ventos soprem em outra direção?. Exatamente pelo mar, o repórter iniciou a aventura pelo Velho Continente. "A Estônia foi o quinto país europeu que conheci. Já havia pisado, antes, na Espanha, Itália, Alemanha e Finlândia. Como eu estava no leste europeu, entre a Rússia e o norte do continente, resolvi cruzar o Golfo da Finlândia para depois chegar na Escandinávia, um dos lugares mais impressionantes do continente europeu.? De barco, o jornalista seguiu de Tallin para Helsinki, flutuando entre cassinos, bares e restaurantes. "Conheço algumas pessoas que não suportam a ideia de cruzeiros. Fobia, mal estar, enfim, nada disso me atormenta. Sempre gostei do oceano e da sua dimensão infinita. A sensação de estar em alto mar e, até certo ponto enfrentando a própria natureza, é algo que me remete ao inatingível. Me agrada a idéia de abrir a janela de olhar para o lado e encontrar a paz na imensidão do horizonte.? Em Heksinki, Chico Santo se deparou com a cidade mais futurística que conhece. "Uma região com uma energia muito forte. Lugar frio e com uma vida noturna maravilhosa. Cheguei a dormir em um sofá dentro de uma balada, em um banheiro. Estive, também, em um pub com três pisos no subsolo. Exatamente como as velhas tabernas, com rock n? roll ao vivo e algumas bebidas diferentes. Helsinki tem uma certa influência cultural da Suécia e também da Estônia. Foi fundada em 1550 por Gustavo I e se tornou um importante ponto estratégico no século XVIII contra o expansionismo russo. Em 1917, quando a Finlândia finalmente se tornou um país independente, acabou sendo escolhida como a capital finlandesa. Há quem considere o local como parte da Escandinávia.? De Helsinki, depois de atracar do outro lado do Golfo da Finlândia, o repórter cruzou o Mar Báltico. "Desta vez entrei, de fato, em um grande navio. Viajei de primeira classe e curti muito a viagem. Como ainda era verão, o sol brilhou até pouco mais da meia noite, no alto mar. Então, seguimos pelos fiordes da Suécia. Uma costa toda recortada, com montanhas rochosas, altas, e uma paisagem cinematográfica. Foi assim até chegar em Estocolmo.? Conhecido como a "Veneza do Norte?, a capital sueca geograficamente é composta pela união de 14 ilhas, interligadas através de 53 pontes. "É a cidade do Prêmio Nobel. Tem sido assim desde 1902. Todos os anos, a cerimônia é realizada com a presença do Rei da Suécia. Tirando a abertura que ocorreu em 1901, em Oslo, na Noruega, já faz parte da tradição. A duração do dia varia em torno de 18 horas no verão e 6 horas no inverno. Historicamente, dá para dizer que foi fundada pelo nobre Birger Magnusson e sofreu em 1710 um dos grandes focos da peste bubônica.?

Em sua rota pela Escandinávia, Chico Santo também passou pela Noruega e Dinamarca. "Fiz o percurso por terra. Na Noruega, evidentemente, encontrei um dos países mais modernos do mundo. Uma nação que se preocupa muito com a qualidade de vida de seus habitantes. Lá, absolutamente, tudo funciona. Do ponto de vista histórico, diferentemente do que ocorreu com a Dinamarca, a Noruega se tornou um dos poucos e fortes centros de resistência a Hitler durante a Segunda Guerra Mundial. Até em virtude do poder de sua marinha. Do ponto de vista econômico, a Noruega possui o terceiro maior PIB do mundo e tem sido frequentemente apontada pela ONU como a nação com o melhor índice de qualidade de vida do planeta. Uma pena ter sido alvo do atentado de 23 de julho de 2011.? Em Copenhagen, por outro lado, o repórter visitou a Igreja de Mármore, Castelo Rosenborg, Casa de Ópera e o Jardim Botânico, entre outros cartões postais. "Trata-se do país mais feliz do mundo. Foi o que levantou uma pesquisa realizada recentemente que levou em conta as questões de saúde, assistência social e educação. O Índice Global da Paz classificou a Dinamarca como a segunda nação mais pacífica da Terra, atrás, apenas da Nova Zelândia. O país encabeça também, de uma forma positiva, a lista do índice de Percepção de Corrupção. E, segundo a ONU, possui o mais alto nível de igualdade de riqueza do planeta. O que mais eu poderia dizer??
No que mais tarde faria parte do documentário jornalístico do repórter sobre a Rota do Conde Drácula, em uma viagem do Reino Unido à Transilvânia, Chico Santo encontrou nos alicerces de um porão subterrâneo da Dinamarca aquele que, não por acaso, poderia ser considerado o lugar ideal para o repouso dos vampiros. "A Europa é um continente que fez da idade média até início do século 20 grandes obras funerárias. São arquiteturas fantásticas que foram construídas para preservar a memória dos seus entes falecidos. Muitos turistas se interessam por essa arquitetura e vão até os cemitérios para estudar. Outros se interessam por história e se deslumbram quando estão diante de um túmulo de 300 anos. Há também aqueles que se interessam por personalidades e vão até os cemitérios para chegar aos túmulos de pessoas famosas. Sinceramente, não enxergo como algo mórbido, mas, sim, como um interesse especial pela arte, história ou pela vida de alguma pessoas?, afirma o sociólogo mestre em turismo Vinicius José Ripol. 

Exatamente no centro de Copenhagen, junto aos jardins góticos de uma igreja medieval, está situada uma das mais fúnebres necrópoles do continente europeu. O cemitério, localizado debaixo do altar onde são realizados os cultos dominicais de uma igreja anglicana, foi construído entre os pilares de sustentação da capela. "Encontrei o lugar por acaso. A Europa tem muito disso. Principalmente a Dinamarca. Estão cheios de esconderijos. A bem da verdade, vi um porão com uma passagem subterrânea. Então, ao descer as escadas encontrei as urnas com restos mortais de séculos passados.? O cemitério está localizado debaixo do piso ecumênico. Ao lado oposto da porta da capela, uma pequena escada conduz o parlamento ao reino dos mortos. "Durante muito tempo as igrejas tomaram conta dos mortos. Foi o que aconteceu no Brasil, por exemplo. Do período colonial até a proclamação de república, os cemitérios ficaram sobre a responsabilidade da igreja. Somente após a nova república o estado passou a ser o responsável pela criação das valas Por isso, alguns dos cemitérios mais antigos do mundo estão localizados junto às igrejas da época, como também acontece na Europa?, explica o teólogo João Francisco Clemente. 
A casa dos mortos da Dinamarca relembra a arquitetura imponente do neoclassicismo. Galerias com arcos artísticos são observadas entre as trilhas que se perdem pelo silêncio da mente. Cada um dos portais que conduz o piso de pedra fria, através do desditoso labirinto, leva a uma anticâmara diferente. Os pequenos salões permanecem lacrados em um lócus de nostalgia. São áreas mortuárias que servem como cantos de repouso às almas: "Não é uma sensação muito agradável. Da garganta do calabouço fica aquele medo de que a porta se feche com você lá dentro. De qualquer forma, não dá para deixar de conhecer um lugar como aquele?, acrescenta o desbravador Chico Santo.

Lado a lado, os caixões que datam do fim do século XIX e início do século XX chamam a atenção no interior do funesto corredor. A maior parte das esquifes fica exposta à poeira e claridade dos poucos raios solares que timidamente penetram na terra. O mal cheiro, por sua vez, não afeta o ambiente. Urnas trabalhadas, com desenhos embalsamados e crucifixos desoxidados, apresentam aos historiadores parte da luxúria que dominou o período de glória da Europa.
"Pela obra do Drácula, escrita por Bram Stoker no final do século XIX, os vampiros procuravam o descanso justamente em cemitérios como o que está situado abaixo da igreja dinamarquesa. Segundo o autor irlandês, os caçadores da noite permaneciam dentro das caixas funerárias durante o dia e só deixavam o local para se alimentar ao cair da madrugada. Bram Stoker revela que os vampiros até podiam andar durante os dias, mas com suas energias reduzidas. Há outras histórias, no entanto, que dizem que os vampiros morrem ao primeiro raio solar. O ponto comum onde se convergem as ideologias é de que obrigatoriamente eles se alimentavam de sangue?.  
Dentro da necrópole dinamarquesa, evidentemente, o clima de terror sobrepujou o comenos. "Poucos minutos se passaram desde o momento da entrada até o retorno à superfície terrestre. Algo como meia hora, mais ou menos, Quando enfim deixei o vale dos mortos e recuei às ruas de Copenhagen, me dei conta que havia estado em um dos cemitérios mais antigos do mundo. Foi algo mórbido, porém, diferente.?
Da Dinamarca, cuja história remete aos ancestrais Vikings, bem como o controle dos poderosos povos da Inglaterra, Noruega, Suécia e Islândia, em diferentes momentos do passado, Chico Santo provocou a lógica e sem hotel, passagem de volta ou qualquer indício que lhe pudesse garantir o visto de entrada no Reino Unido, embarcou para Londres, em mais uma de suas aventuras pelo mundo...
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