“Uma das muitas distinções entre a celebridade e o herói é que um vive apenas para si, enquanto o outro para redimir a sociedade”

“Uma das muitas distinções entre a celebridade e o herói é que um vive apenas para si, enquanto o outro para redimir a sociedade”

“Uma das muitas distinções entre a celebridade e o herói é que um vive apenas para si, enquanto o outro para redimir a sociedade”, com estas palavras o mitólogo Joseph Campbell define as diferenças entre aqueles que vivem para o próprio ego daqueles que buscam de fato um mundo melhor.

Vivemos num momento em que atletas, artistas e outras personalidades mostram facetas positivas enquanto estão sob as lentes e holofotes. Lágrimas escorrem de seus olhos à cada close e flash das câmeras, depois muita coisa muda.

O Brasil é um país de poucos heróis e cada vez mais entra em uma zona cinzenta na qual não é possível distinguir-se quem é quem. Um jogo nebuloso por poder, sexo e dinheiro. Celebridades são mais conhecidas por suas personalidades extravagantes do que pela profissão ou ofício.

Uma das poucas figuras que não pertence a este jogo decante é Eder Jofre, o Galo de Ouro. Nos ringues doou seu corpo para ajudar na ascensão social de sua família e por fim mostrou ao mundo que o homem brasileiro é tão capaz quanto os outros ao se tornar campeão mundial de boxe na categoria dos galos, um menino vindo do empobrecido Parque do Peruche.

“Se um amigo precisa e me pede ajuda porque vou negar, eu sabia que tinha prestígio e usava dele para ajudar os mais necessitados”, me confirmou certa vez numa conversa ano passado. Aqueles que conviveram com ele confirma e os favores não eram só para amigos, mas principalmente necessitados.

Depois de ter o tapete puxado dentro e fora dos ringues perdeu o trono dos galos, mas mesmo assim entrou como o maior de todos os tempos na sua categoria e um dos grandes da história. Voltou mais velho desacreditado por muitos sendo ridicularizado pela imprensa.

Com o rosto marcado pelo tempo e endurecido no espírito conseguiu com o mesmo sorriso de menino superar críticos e rivais para conquistar o trono dos penas. Mais uma vez o Brasil tinha seu respeito nos esportes reconquistado dentro do quadrilátero.

Com a morte do pai Kid Jofre e do irmão Dogalberto não tinha mais ninguém em seu corner e resolveu deixar aquilo que faria melhor. Ao ver os tios defendendo os direitos das minorias e melhorias na educação sendo até presos pela ditadura entrou na política. O fez de forma atabalhoada de início, mas se manteve.

Os piores golpes de sua vida foram na câmara dos vereadores de São Paulo e sentiu estes trancos ao lado do filho Marcel – que segue presente em sua vida –.Sempre afirmou que no boxe sabia de onde vinham as pancadas, mas naquele prédio de paredes de mármore branco as flechas e lanças vinham de todos os lados em uma versão tropical do Inferno de Dante: “Vós que aqui entrai abandonai toda esperança”.

Mesmo nesta situação manteve nome respeitável mantendo a palavra, lutou pelo bem das vítimas das enchentes, mas foi barrado pelo então prefeito Paulo Maluf. Tomou o que acredita ter sido uma punhalada nas costas pela imprensa então se retirou. A velhice veio e como acontece com muitos personagens do Brasil que não venceram com bolas nos pés ou em telenovelas foi sendo esquecido.

No sábado (29/03/14) celebrando seu aniversário de 78 anos estava rodeado pelos parentes, amigos próximos e boxeadores veteranos que vieram depois dele e o têm como inspiração – muito do que temos de respeito nos esportes de lutas se deve a ele –.

Em países com respeito pelos seus atletas como Argentina, EUA, Japão e México o evento teria mais atenção. A figura dele seria mais presente, principalmente por ser um exemplo positivo para jovens.

Sentado, com os olhos um tanto perdidos parecendo procurar pela esposa Cidinha falecida ano passado, conversamos um pouco e falamos de como é importante manter a palavra. “Mas não é bom ser assim? Você dorme tranquilo e além de ter o respeito dos outros tem respeito a si mesmo”.

Após perder a companheira no primeiro semestre do ano passado foi morar com a filha Andrea e o genro Antonio Oliveira. Nas vezes que o visitei percebi a atenção que o casal tem com ele, suas vontades e necessidades. O filho Marcel continua presente como sempre foi, inclusive aguentou muitas das porradas nos tempos da Câmara dos Vereadores.

No aniversário ficou muito com a prima Mara, filha do tio boxeador Ralph Zumbano, e com os amigos de infância Túlio Liporini e o primo Sylvano Zumbano. Ele comentou da ausência do peso-pesado Raphael Zumbano, conhecido como “Zumbano Love”, o último representante da dinastia nos ringues.

Além de outros parentes estavam presentes os ex-pugilistas Servílio de Oliveira, Sidnei Dal Rovere e Chiquinho de Jesus além do comentarista Wilson Baldini Jr. Foi uma noite para lembrar uma trajetória de consagração e principalmente superação.

Eder Jofre é tido pela tradicional Ring Magazine como o maior lutador dos anos 1960 independente de peso à frente dos lendários americanos Muhammad Ali e Joe Frazier. Os títulos do menino do Parque do Peruche nas categorias galo e pena junto das de Pelé, Maria Esther Bueno e Emerson Fittipaldi colocaram o Brasil no Olimpo do esporte.

Gerações de atletas e principalmente celebridades vão passar conforme os dias e as décadas, mas Eder mesmo tendo seu brilho usurpado pelos meios de comunicação em um país de pouca tradição de história esportiva continuará tendo seu nome respeitado e reverenciado nos países com estes valores.

No Twitter: @gabrielleao

Foto: Portal TT

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