Jornalista da Revista Placar fala sobre o racismo no Brasil, em que mais da metade da população se considera preta ou parda.

Jornalista da Revista Placar fala sobre o racismo no Brasil, em que mais da metade da população se considera preta ou parda.

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Se você chegar de supetão na redação do jornal Agora S. Paulo e falar sobre o jornalista Marcos Sérgio Silva ouvirá: “ele é dez” e não seria diferente se você perguntar na emissora de TV à cabo ESPN Brasil: “gente boa demais” e até na Placar, principal e única revista sobre futebol no país, sua atual casa profissional, é taxado pelo repórter Ricardo Gomes: “figuraça”.

Poucas profissionais conseguem ser tão queridos quanto Marcos Sérgio Silva, repórter na veia, com passagens pelo grupo Folha e agora na Editora Abril.

Mas por trás desta personalidade de benevolência há opiniões seguras e fortes sobre os aspectos que afligem o país, o mundo e as pessoas.

Marcos é o entrevistado da semana da seção “Linkado” e falou sobre uma situação que ainda atinge mais da metade dos brasileiros: o racismo.

 

 Leia a entrevista abaixo:

 

Terceiro Tempo: o brasileiro é racista?

 

 

Marcos Sérgio Silva: é um racista cordial. Ele não nega o negro, mas também não dá ao negro as mesmas condições. Também não poupa o negro de piadas e comportamentos que o denigrem.


Terceiro Tempo: quem pratica o racismo no Brasil?

 


Marcos Sérgio Silva: Quem se recusa a entender que é preciso corrigir as deformações de um país no qual existiu um sistema escravagista de mais de três séculos. O negro partiu de um ponto que nem mesmo o mais pobre imigrante precisou partir para justificar sua cidadania. Logo comparar questões de raça e sociais é um parâmetro que não pode ser usado, justamente porque os negros tiveram que vencer obstáculos educacionais e profissionais para se afirmarem.


Terceiro Tempo: segundo o IBGE, os negros ganham um pouco mais que a metade dos brancos. Por que isso acontece no Brasil?


Marcos Sérgio Silva: Porque o negro demorou a se afirmar como profissional por políticas que não o beneficiavam. Na era pós-escravagista, os negros, salvo raras exceções, tiveram que frequentar as piores escolas e as piores vagas oferecidas. Somente um sistema de cotas que corrija essas distorções e que faça com o que o negro alcance os avanços obtidos por outras raças e classes o fará atingir patamares parecidos com o dos brancos.


Terceiro Tempo: no caso do Tinga no Peru, o brasileiro se solidarizou de modo em geral. Você acredita que os mesmos praticaram de demagogia na situação?


Marcos Sérgio Silva:
 Acredito que não. O insulto racista sempre chocou o brasileiro – afinal, esta era a reação dos vizinhos à nossa seleção de futebol, quando éramos chamados de macaquitos. Acredito que, com o episódio, o brasileiro lembrou dessa época cruel. Mas há, em outros esportes, episódios semelhantes. A própria torcida do Cruzeiro, em uma partida de vôlei, insultou o jogador Michael, do Vôlei Futuro, por ele ser homossexual. A linha pode ser bastante tênue.


Terceiro Tempo: quais são as atitudes consideradas implicitamente racistas e toleradas pela sociedade?


Marcos Sérgio Silva:
 Ela existe em toda parte. No transporte, onde o tratamento dado a usuários das linhas 3 e 5 do metrô de São Paulo, por exemplo, é pior que nas outras linhas. São usuários mais pobres e onde a população negra mais se concentra. Na segurança, quando o alvo da revista policial quase nunca escapa do negro ou pardo. Na prontidão de vigias quando um negro entra em um banco. Eu não diria que ele é implícito – pelo contrário, o racismo é explícito.


Terceiro Tempo: o negro no Brasil é aceito pelas classes mais abastadas quando se torna rico e poderoso?


Marcos Sérgio Silva:
 Sim, mas quase sempre com o complemento: ou é jogador de futebol ou é músico/sambista. O ministro Joaquim Barbosa, por exemplo, teve o seu relacionamento com uma mulher branca questionado – e por um site de esquerda. Quando o celebram, lembram da infância difícil, uma maneira de afirmar que a estrutura familiar dos negros é diferente da dos brancos.

 
Terceiro Tempo: por que a predominância dos ídolos negros brasileiros se consolida no espectro esportivo?


Marcos Sérgio Silva:
 Porque foi justamente lá que eles se encontraram em igualdade de condições com os brancos. Desde que a segregação esportiva caiu, nas décadas de 20/30, eles puderam competir de igual para igual com outras raças. A desigualdade em outras áreas começou a cair recentemente.



Terceiro Tempo:
 por que não há, apesar da miscigenação do povo, tantos negros advogados, jornalistas, médicos e outras profissões com curso superior e há tantos em penitenciárias?


Marcos Sérgio Silva:
 Justamente porque nunca houve condições para que eles vencessem a barreira de um ensino fundamental fraco. Negros, como afirmado, ganham pouco mais da metade dos brancos. Não têm condições de dar aos filhos a educação que o branco pode dar. Muitos entram no mercado de trabalho cedo para suprir as necessidades da família – ou, sem oportunidades, são seduzidos pelo mundo do crime. O sistema de cotas corrige em parte esse problema por dar aos negros a condição de se equiparar aos brancos que tiveram uma boa preparação na adolescência. E corrige um erro histórico, que foram os mais de três séculos de escravidão, que os colocou em condições sub-humanas e que ainda hoje precisam ser reparadas.


Terceiro Tempo: os negros e os pardos no Brasil tem a densidade de etnia de 50,7 % , você acredita que eles tem as mesmas oportunidades na vida profissional e educacional dos brancos?


Marcos Sérgio Silva:
 Não. A maior parte não consegue entrar nem mesmo no curso superior por problemas vinculados à baixa remuneração e à fraca preparação nos ensinos básico e superior. O que, por tabela, também dificulta a chegada deles nas melhores vagas do mercado de trabalho.


Terceiro Tempo: o sistema de cotas para os negros nas universidades federais mudou ou vai mudar alguma coisa no Brasil?


Marcos Sérgio Silva:
 Já mudou. Já é possível ver negros nas universidades. Em breve, eles estarão disputando com os brancos os melhores cargos nos mundos privado e público. É preciso acelerar esse processo, para que os filhos desses negros possam ter a oportunidade que os brancos tiveram sem a ajuda de cotas. As cotas não são eternas, mas são um meio de consertar uma tragédia chamada escravidão.

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