Entrevista do jornalista Maurício Sabará com Maria Rita Rodrigues, esgrimista que virou triatleta

Entrevista do jornalista Maurício Sabará com Maria Rita Rodrigues, esgrimista que virou triatleta

MAURÍCIO SABARÁ: Desde criança você tem uma vida voltada para os esportes, já fazendo parte de uma escolinha. Cite com quantos anos começou, local e quais modalidades praticava.

MARIA RITA RODRIGUES: A primeira modalidade esportiva que tive contato foi a natação, que aprendi com 4 anos de idade. Mas antes disso, minha mãe havia me matriculado em um curso de natação para bebês. Depois da natação comecei com a escolinha de esportes do Esporte Clube Pinheiros, o CAD (Centro de Aprendizado Desportivo). Passei por modalidades coletivas, como futebol de campo, atletismo, polo aquático, saltos ornamentais, handebol, basquetebol, voleibol e ginástica artística. De todas essas, pólo era a que mais gostava. Depois que "me formei" na escolinha, fui convidada para participar dos treinos de pólo, visando competição mesmo. No entanto na época tinha 10 anos e era muito nova para a modalidade, precisava ter ao menos 12 anos, pois não havia turmas com crianças tão jovens.

MAURÍCIO: Conte sobre a influência do seu pai no início da sua carreira. Pelo que sei, ele admirava a forma como você jogava tênis.

RITA: Sim, depois que saí do CAD fui jogar tênis, pois meu pai e meu avô jogavam. Fiquei uns 2 anos no tênis, costumava jogar com meu pai e com garotos mais velhos. Geralmente eu ganhava. Tinha um backhand muito forte. Meu pai sempre achava incrível.

MAURÍCIO: A esgrima foi o esporte que fez com que sua carreira decolasse. Faça um panorama de suas atuações na modalidade, principais títulos, momentos mais marcantes e estilo de luta.

RITA: Comecei a esgrima aos 14 anos. Parei com o tênis, pois tive uns problemas pessoais e não quis saber de esporte durante uns 2 anos. Em 2004 meu irmão começou a fazer aulas de esgrima no clube e em novembro fizeram uma espécie de torneio de iniciantes. Fui assistir e achei super legal. No ano seguinte comecei a praticar, mas era floretista. Fiquei um ano nessa arma e depois pedi para o meu técnico para mudar. Esperava que fosse me colocar no sabre, mas me colocou na espada. Na hora fiquei um pouco decepcionada, mas acho que foi uma boa idéia. Pouco tempo depois fui campeã paulista em todas as categorias de base e depois comecei a conquistar pódios em provas adultas. Daí em diante foi uma alegria atrás da outra: foram títulos brasileiros, sul-americanos, participações em Universíadas, Mundiais, Copas do Mundo, Pan-Americanos. Viajei o mundo jogando esgrima, conheci muitas pessoas. Com certeza tudo o que faço hoje devo a esgrima.

MAURÍCIO: Por que você optou pelo triátlon, tão diferente da esgrima? Destaque também seus principais momentos no esporte.

RITA: Em 2010 fui convidada para experimentar o Pentatlo Moderno. O convite veio de um amigo meu, o Enrico Ortolani, pentatleta aqui de São Paulo. Ele treinava esgrima comigo no Pinheiros alguns dias da semana e ele sempre notou que era "workaholic", algo visto como pré-requisito para quem quer se envolver com modalidades multi-esportivas. Tinha facilidade com corrida também. Na época na esgrima éramos submetidos à realização do Teste dos 12 minutos para determinar aptidão física aeróbia. Isso era um pré-requisito para a participação em provas internacionais da categoria adulta. A gestão da esgrima no país era toda militar, e esse teste era obrigatório. Muitos atletas ficaram de fora de Jogos Pan-Americanos e Sul-Americanos durante todo início dos anos 2000 por fracassarem no teste. Nunca tive muitas dificuldades com ele. Sempre gostei de modalidades cíclicas e demonstrava certa facilidade.

No final de 2012/início de 2013, fiquei 4 meses treinando na Europa. Fiquei numa cidade chamada Saint-Maur-des-Fossés, perto de Paris, treinando com atletas do mundo todo numa espécie de camping training. Aos finais de semana, viajávamos para jogarmos Copas do Mundo e Campeonatos Regionais Franceses. A idéia era pegar experiência internacional para crescer mais ainda no cenário brasileiro (na época deveria estar entre as 10 ou 8 no ranking nacional), visando a classificação para os Jogos Olímpicos Rio 2016. Entretanto voltei muito desanimada, pois sabia que se quisesse "brigar" para ficar entre as 4 melhores do país teria que voltar para a Europa todo ano, para jogar provas de nível mais elevado e ter qualidade e variedades de sparring. Não tinha dinheiro para bancar idas anuais a Europa, não tinha patrocínio e para completar, estava no meu primeiro ano na Escola de Educação Física e Esporte da USP. Tinha acabado de transferir de outro curso da USP e estava super empolgada, pois agora estava estudando o que eu queria. No final das contas, desanimei muito com a esgrima e comecei a passar com um psicólogo esportivo, que me ajudou demais. Não adiantava nada ficar sofrendo sendo que estava infeliz no esporte. Por isso "joguei tudo para o alto" e fui treinar Pentatlo Moderno, junto com a ajuda do Enrico e do Fábio Carrara, ex-pentatleta e técnico do Enrico. Meu primeiro contato com o triátlon ocorreu por causa do pentatlo moderno. Eu treinava corrida com a equipe de triátlon do Pinheiros. Fazia "pista" com eles nas noites de quartas e sextas. Era uma equipe fortíssima. A Ariane Monticelli treinava com o pessoal nesse horário. Achava demais ver aquela moça correndo. Motivava-me demais. O triátlon era muito diferente do Pentatlo, mas me identifiquei muito mais, sobretudo por ser mais voltado para o endurance do que o pentatlo. A corrida no pentatlo era composta por 4x800m, seguido por um momento onde atirávamos. No triátlon, é contínuo. Me dou melhor com provas desse caráter, pois não sou muito veloz. Meu primeiro triátlon fiz "de brincadeira" para ver como me sentia. Foi em 2014. Não fiz nenhum treino específico, só as pistas com o pessoal. Mantive meus treinos de natação, esgrima e hipismo por conta do pentatlo, mas fazia umas aulas de spinning. Comprei uma bike road uma semana antes da prova. Foi patético, dá até vergonha de lembrar. Pedalei de tênis, pois tinha medo de cair por não saber clipar a sapatilha.

Depois disso veio uma lesão no calcâneo. Fiquei 6 meses só nadando, treinando esgrima bem de leve e pedalando no spinning. Foi um período bem chatinho. Acabei revendo muitas coisas e percebí que:

1- Estava adorando triátlon, muito mais do que pentatlo moderno;

2- Estava inviável treinar hipismo, pois era um esporte caríssimo. Além do mais, me sentia mal "esporando" os bichinhos;

3- Treinar uma modalidade com outras 5, nas quais 2 eu dependia de outras pessoas era algo inviável para minha vida, pois meus horários são caóticos e muitas vezes treino "aonde dá". Bike, corrida e natação são muito mais fáceis de encontrar lugar para treinar do que hipismo e esgrima, não é mesmo?

Foi então que decidi ficar no triátlon. Desde 2015, entre idas e vindas, permaneci treinando e competindo. Cheguei até ganhar uma etapa do Troféu Brasil de Triátlon na minha categoria, em 2015, na distância sprint. Ano passado acabei me aproximando mais da esgrima por conta da Rio 2016, então deixei o "nada-pedala-corre" de lado. Muitos amigos meus classificaram e fiquei empolgadíssima em acompanhá-los. Assim como meu técnico, Marcos Cardoso, que foi como técnico da seleção olímpica de espada. Perdi condicionamento e engordei bastante no período, mas foi gratificante passar por esse momento com eles, pois treinamos juntos desde novinhos. Também "matei as saudades" dos combates, né? Desde outubro do ano passado estou treinando exclusivamente triátlon. Estou retomando minha forma. A idéia é fazer um meio-Ironman daqui 2 anos, quando terei 28 anos. E quero "me dar de presente" de 30 anos, completar um Ironman. Vamos ver se consigo! Atualmente corro na distância olímpica. Minha natação é boa, corrida média e bike horrível. Ainda sou muito nova no esporte e estou aprendendo. Melhoras exigem tempo. Estou focando em melhorar meus tempos e isso é algo bastante gratificante para mim: o maior adversário é o relógio e não outra pessoa, como no caso da esgrima.

MAURÍCIO: Você é uma excelente atleta, tendo participação em algumas meia-maratonas. Não poderia deixar de perguntar sobre a São Silvestre. Relate suas participações. Considera como a prova de corrida pedestre mais charmosa do Brasil?

RITA: Participei da São Silvestre em 2013, 2015 e em 2016. Em 2014 não corri, pois estava lesionada, infelizmente. Em todas as minhas participações meus tempos foram horríveis. Corro melhor meia-maratona, quem tem 6 quilômetros a mais, do que a São Silvestre. O percurso é duro, é muita gente amontoada.

Talvez o glamour esteja somente com quem corre no pelotão de elite, mas no geral amador é terrível. Acho que muita gente quer participar, pois tem algo meio icônico em torno da São Silvestre, pois ser a prova de maior reconhecimento nacional. Tem muitas pessoas sem treino que participam. É um pouco frustrante para quem corre por tempo, pois depois que descemos até o Pacaembu já tem pessoas que começam a caminhar, o que atrapalha demais aqueles que querem correr para melhorar alguma marca pessoal. Por isso que é uma prova "festiva". Não dá pra levar muito a sério. É pra completar, ir pra casa, descansar e comemorar a virada de ano. Mas é divertida. Uma ótima maneira para fechar o ano.

MAURÍCIO: Boa parte dos esportes que você praticou e ainda pratica são amadores. Nosso país precisa aplicar uma política de incentivo para essas modalidades, não é mesmo?

RITA: Tivemos um período fantástico no campo esportivo nos últimos anos para as modalidades olímpicas. Passei boa parte da minha carreira atuando de maneira "semi-profissional", pois recebia remuneração do Programa Bolsa-Atleta e do Programa USP nos Jogos Olímpicos (que infelizmente duraram dois anos, pois logo depois veio à tona a crise orçamentária). Depois a situação foi piorando. As vésperas da Rio 2016, vi conhecidos e amigos com chances reais de participação tendo alguns incentivos e patrocínios cortados. Agora que tudo passou está bem mais complicado. Mas se pararmos para analisar, nem o futebol está tão bem assim. É complicado. A gestão esportiva no país é muito imediatista. Enquanto as coisas funcionarem dessa forma, não sairemos do lugar. Antes de pensar em incentivo financeiro para atletas, temos que construir uma cultura de prática esportiva no país.

MAURÍCIO: Nos meses de janeiro e fevereiro de 2017 você trabalhou no Sesc e continuará exercendo o serviço. Conte como foi essa experiência e o que acha do incentivo que o clube dá na prática esportiva e cultural.

RITA: Foi bem legal. Trabalhei mais com recreação, mas agora que fui efetivada no estágio anual verei todas as atividades. O intuito do Sesc é fornecer aos frequentadores a experiência da atividade. A idéia não é formar atletas e competir, mas sim, aprender, se envolver e participar. É totalmente diferente da minha área, mas acho super importante.

MAURÍCIO: Quais são os seus projetos para o futuro?

RITA: Por enquanto, quero me formar no bacharelado em Esporte e prestar vestibular novamente, para o curso de nutrição. Pretendo abrir uma consultoria esportiva futuramente, onde quero oferecer aos alunos o serviço completo de treinamento e nutrição. Pensei em depois fazer um mestrado também, pois gosto muito da área de pesquisa. E claro, continuar.

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