Confira o relato do jornalista do R7

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"Cosme, vem aqui. Por que você não faz uma exclusiva para o seu blog com esse menino? Ele vai serrr um dos grandes jogadores do Brasil daqui uns anos. Os meus amigos de Santos me dizem que é melhorrr do que o Robinho. O Delcir (Sonda) é um avião. E já comprou parte do garoto. Esse aqui é o pai dele."

"Ele é um ótimo jornalista. Tem um blog que as pessoas leem muito. Trabalhou 150 anos no Jornal da Tarrrrde. É um cara sério."

E Neymar da Silva Santos me abre um grande sorriso e estica sua mão direita. Sem graça e surpreso, devolvo o aperto de mão. Eu não tinha a menor ideia de quem ele era.

Ao seu lado, estava um garoto arrumado, havia acabado de ser entrevistado na tevê. Magrinho, físico frágil, cabelo raspado à maquina, me olhava curioso. 16 anos. Esperto, imitou o gesto do pai. Me cumprimentou sorrindo, amigável.

Também nunca tinha visto mais magro.

"Cosme, quando você quiser. É só ligar, o atenderemos em Santos com o maior prazer. Se quiser fazer agora..."

Olhei para o Milton Neves, sem graça.

Ele estava sendo muito gentil.

Mas eu pensava em assassiná-lo.

E colocar sua cabeça na praça principal de Muzambinho.

Detesto essas situações forçadas.

Estávamos no pátio da TV Bandeirantes.

Não iria entrevistar uma promessa santista, que não conhecia. Para falar a verdade, nunca tinha ouvido falar no seu nome. A impressão que tinha, na época, era que o Santos lançava `um novo Robinho´ a cada mês. Por falha minha, nunca prestei atenção nas jovens revelações do futebol brasileiro. Arrogância de repórter veterano, que acreditava que só deveria falar com o jogador consagrado.

O menino, o pai e Milton esperavam minha resposta.

Pensei na mesmice das entrevistas com jogadores iniciantes no Brasil. As que nunca gostei de ler. O sacrifício dele, da família. O pai ensinando a chutar com a perna direita, com a esquerda. A cabecear. Cobrar do filho o que não conseguiu alcançar.

A sorte de ter vencido centenas de concorrentes na base. O apoio especial de um treinador. O ídolo. A importância da fé. No destino, na religião, na certeza de que será um jogador importante. E a vontade retribuir financeiramente o esforço dos pais.

Os meus 23 anos de JT me traumatizaram. Cabia aos repórteres iniciantes repetir essas entrevistas, todo início do ano. Sim, a indefectível e absurda Taça São Paulo. Com mais de 100 times para disputarem um torneio de um mês. Era só esperar o dia 25 de janeiro, aniversário de São Paulo e data da decisão, para surgirem aquelas duas páginas, com os `heróis´ do título. E as mesmas declarações, ano após ano. O chavão que doía a retina. `Diamante bruto a ser lapidado´, em todos os textos, ano após ano. Não importasse quem escrevesse.

Tinha verdadeiro pavor de ser escalado para cobrir essas finais de Taça São Paulo, pedia para fazer qualquer outra coisa. Menos ir para o Pacaembu.

Olhei para Neymar Sênior e decidi.

"Olha, muito obrigado. Vamos marcar sim, essa entrevista. Mas outro dia. Agora, tenho de voar para fazer uma matéria, me desculpe. Na verdade, estou até atrasado. Muito prazer. Vou ligar", anotando no meu bloco companheiro, o celular do pai do garoto. Percebi o ar de decepção. Mas estiquei a mão para o garoto.

"Toda a sorte do mundo para você."

"Obrigado", apertou a minha mão, com força, me encarando.

Ele também queria falar.

Lembro do pai e filho dando abraços efusivos em Milton Neves, antes de irem embora.

A cena aconteceu em 2009.

Lógico que joguei o bloco de anotações fora, quando estava mais do que cheio. Rabiscado até na capa, como sempre fiz. Foi para o lixo com o telefone da casa daquele garoto mirrado. Naquele mesmo ano, ele começou a entrar no time santista, mostrando seu especial talento.

É muito gostoso expor as vitórias ao recordar o passado nestes mais de 30 anos de carreira, mas as falhas existiram. O faro de repórter falhou também. O que valoriza ainda mais os poucos acertos.

Desde 2009, minha relação com Neymar só foi piorando. Lógico que reconhecia seu espantoso crescimento técnico. O talento raro. O potencial espetacular. Mas sempre cobrei comportamento de um dos maiores ídolos do futebol brasileiro e, depois, mundial.

As situações não foram edificantes.

No ano seguinte, acompanhei sua ascensão no time principal do Santos. Fiquei empolgado com seus dribles, seus gols. E tremendamente decepcionado com a briga com Dorival Júnior. Vi o outro lado de sua personalidade. A arrogância porque o técnico não o deixou cobrar um pênalti contra o Atlético Goianiense. O xingou, fez um enorme escândalo.

E soube, pela melhor fonte possível, de sua triste atitude no vestiário. Cobrado pelo auxiliar de Dorival, o ex-goleiro do Palmeiras, Ivan Izzo, Neymar foi ainda pior. Jogou um copo de Gatorade no rosto de Ivan. Quem conhece o ex-goleiro sabe o quanto ele é forte, assim como sua personalidade. Teve de ser contido para não bater em Neymar. Resultado, Dorival e Ivan demitidos. E o mimado garoto santista preservado.

Com liberdade no blog, provocava. O chamava de Justin Bieber do Suarão. Em homenagem ao comportamento rebelde, mas sua vontade midiática de aparecer. Se expondo com roupas absurdas, cabelos de todas as cores. A ansiedade pelos holofotes. Mas principalmente pelos exageros, pela falta de respeito. Por exigir tratamento diferenciado, onde quer que fosse.

Uma produtora me procura e diz que Neymar Sênior estava magoado comigo. E que tinha muito orgulho das visitas que a família fez ao Suarão, quando Neymar era menino. Suarão não é uma praia refinada do Litoral Paulista, digamos assim. Eu não tinha nem ideia que eles a frequentaram, a escolhi pela sonoridade do nome.

Não sabia, mas era uma premonição. Beckham foi pioneiro. Ronaldo aprimorou. Cristiano Ronaldo virou o símbolo de jogador midiático. Neymar queria virou celebridade. Quando o vi batendo bola com Justin Bieber, em um encontro armado com assessores, ri sozinho, diante do computador.

Em 2011, tive a oportunidade de cobrir, pelo R7, a disputa do Mundial de Clubes no Japão. O Santos de Muricy iria enfrentar o Barcelona de Guardiola. Encontrei Neymar no elevador do hotel, antes da final. Nos cumprimentamos rapidamente. Não iria perder a oportunidade. "E essa história que você vai para o Barcelona?", perguntei rápido. Ele olhou para mim e disse, irritado, "Não tem nada, não tem nada". E saiu o mais rápido possível do elevador.

Encontrei Neymar Sênio e Odílio Rodrigues, então vice-presidente santista, no lobby do hotel. Perguntei aos dois sobre o Barcelona. A resposta igual, parecia combinada. "Não tem nada. É só especulação." Me senti um otário ao saber que naquela altura, Neymar Sênior já havia até recebido 10 milhões de euros do Barcelona, pela `preferência´. E Odílio sabia.

Depois, eu e o repórter do UOL que cobre o Santos, Samir Carvalho, testemunhamos outra situação constrangedora. Neymar e Elano querendo passear por Yokohama, em um momento de folga. Torcedores japoneses, muitos com filhos, queriam fotos e autógrafos. Os dois atletas gritavam, irritados, exigindo que se afastassem. Ambos ficaram tensos quando nos viram. Samir foi filmando tudo. Eu fiquei extremamente decepcionado. Não era maneira de ídolos tratar fãs.

Depois veio o jogo contra o Barcelona. O 4 a 0 mais fácil que testemunhei. Depois, vi o longo abraço de então presidente do Barcelona, Sandro Rosell, em Neymar, na zona mista. E uma piscada do dirigente espanhol para o jogador santista. Agora é fácil somar um mais um. Na época era pura desconfiança. Hoje é certeza que fizeram a imprensa brasileira e a espanhola de bobas.

Voltei a conviver com Neymar em Londres, na disputa da Olimpíada de 2012. E ele já era estrela principal do futebol brasileiro. Dono da concentração. Tinha Mano Menezes na mão. E uma característica veio à tona. Ele é um péssimo perdedor. Quando as coisas vão bem, ele é solícito. Quando vão mal, parece outra pessoa. Intolerante. Principalmente nos bastidores, sem as luzes da tevê ligadas. Quando os pedidos são dos repórteres `da escrita´.

O Brasil capengou naquela Olimpíada, apesar da medalha de prata. E Neymar foi ficando cada vez mais irritado com as cobranças. Quando veio a derrota para os mexicanos. Lágrimas no campo. E raiva, como se os jornalistas brasileiros tivessem a obrigação de apoiar o futebol ruim do time.

A última vez que em esteve acessível, sorridente, foi a Copa das Confederações, em 2013. A vitória, a festa, a ida para o Barcelona. Tudo o estimulava. E após os jogos, ele fazia questão de falar.

Veio a ida para o Barcelona e a mudança.

Um jornalista espanhol foi bem claro comigo. Neymar pegou o melhor e o pior de Messi. O argentino é um talento absurdo dentro de campo. Mas fora, acredita que a imprensa tem de ser parcial, apoiar o Barcelona em todos os momentos, principalmente nas derrotas. Afinal, a equipe representa a vontade da Catalunha em ficar independente da Espanha.

E pior, Messi tem uma licença especial.

Só fala quando quer.

Há temporadas nas quais só deu uma coletiva.

Durante o ano todo.

Neymar passou a imitá-lo com os jornalistas.

A triste contusão que sofreu na Copa evitou o confronto.

Mas visivelmente ele não perdoou a cobrança dos jornalistas sobre o time dos 7 a 1. Nos jogos da Seleção foi se tornando cada vez mais distante da imprensa nacional. Principalmente depois dos fracassos no time de Dunga. Da expulsão, da briga contra os colombianos. Ele tinha e foi criticado no blog. E sempre será, quando errar. Como ganhará elogios quando for bem com a camisa brasileira. Ponto final.

Veio a Olimpíada do Rio. Nos cruzamos algumas vezes nos saguões de hotéis. A campanha do time de Rogério Micale era péssima, até a chegada de Tite. E mais críticas, principalmente nos vexames em Brasília, contra a África do Sul e Iraque. Neymar quando me via, passou a nem cumprimentar. Eu também deixei de fazer questão, enquanto via vários colegas tentando dar bom dia, boa tarde ou boa noite e ficando `no vácuo´. Isso não iria passar.

É o único jogador no time de Tite que tem licença para jogar e não dar uma entrevista. O único. Ele não abre mão desse privilégio.

A relação de Neymar com a imprensa brasileira é complicada. Ele aprendeu como ninguém a usar as redes sociais para falar o que quer. Não precisa ouvir perguntas desconfortáveis. Entrevistas exclusivas, gosta de dar a poucos apresentadores de televisão, que o enchem de elogio.

Até mesmo o pessoal da Globo, de quem era `parceiro´, deixou de ser interessante. Principalmente depois das críticas de Galvão Bueno durante os Jogos do Rio. Apesar das várias tentativas de aproximação. Ele deixa claro que não precisa da imprensa brasileira e nem de país algum.

Tem mais de 180 milhões de seguidores nas redes sociais.

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