Como ele conseguiu a informação?

Como ele conseguiu a informação?

Luiza Oliveira

Do UOL, em São Paulo

No último dia 18, Marcelo Bechler entrou ao vivo na televisão e cravou: Neymar será jogador do PSG. A notícia causou uma reviravolta no mundo do futebol, mas ele não imaginava que também provocaria uma reviravolta na sua própria vida. Nesses 24 dias, o repórter do Esporte Interativo sofreu ameaças, virou celebridade e não parou de trabalhar.

A partir daquele momento, o telefone não parou de tocar e as notificações nas redes sociais se multiplicaram. A rotina passou a ser de 6 entradas ao vivo por dia, noites em claro e mais de 30 entrevistas para veículos de diversos países… da rádio universitária de Bauru a CNN dos Estados Unidos e da Inglaterra.

A repercussão assustou quando surgiu uma enxurrada de comentários maldosos, em tom de deboche, ofensas e até ameaças. Marcelo levou no bom humor quando um seguidor o ameaçou: “Se for mentira, vamos invadir tua casa”. “Traz Paçoquita”, ele respondeu. Mas também viu a situação passar do limite e precisou fechar o Instagram para poupar a sua família de vê-lo sofrer em outro continente.

“Não ofendi ninguém. Não chamei corintiano de maloqueiro, flamenguista de gambá ou sei lá do que chamam flamenguista. Só falei que um cara ia de um clube para outro. Um espanhol que trabalha perto da minha casa falou que eu ia sofrer a ira dos espanhóis. Não é possível que a gente viva em uma era de tanto ódio que uma informação gere tudo isso”, disse.

“Eu entrava no Instagram e tinham 50 comentários da mesma pessoa me chamando de tudo o que é possível. Fechei o Instagram, isso me chateou bastante. Não tenho tempo de conversar todos os dias com a minha família, o fuso horário atrapalha, então eles veem muitas notícias pelas redes sociais. Eu ficava bem mal, a minha mãe é dona de casa, ela acha que é sério, não gosta de ver o filho sendo chamado de mentiroso, inútil. Ficou muito chateada com comentários negativos”.

O assédio foi tão grande que ele recebeu até propostas indecentes com mensagens de pessoas que se passavam por empresário. Certo dia, recebeu uma mensagem. “Trabalho como empresário e podemos ganhar muito dinheiro com isso”. Cortou logo a conversa.

A fama repentina também veio para o bem. O repórter foi reverenciado por ídolos que tem no jornalismo e ganhou uma legião de novos fãs. Os mais empolgados agora o consideram o “rei dos furos” e esperam que ele dê informações exclusivas sobre toda e qualquer transação na Europa seja envolvendo Philippe Coutinho, Dembelé ou Dybala. Nas redes, há quem diga: “só acredito se Marcelo Bechler falar”.

“Aqui em Paris eu fui fazer um ao vivo na porta do hotel e cantaram em coro Marcelo. Tinha fila de gente querendo tirar foto comigo. Não nasci para isso, não sou bobo de rede social. Nunca fui assim. Não gosto nem de aniversário. Não sou Di Marzio (jornalista italiano da Sky Sports) que vai dar furo todos os dias. Eu corri muito atrás da notícia, mas não esperem isso de mim todo dia”.

Mas ele também deixa a modéstia de lado e dá um “tapa com luva de pelica” em quem debochou da informação. “Não foi a primeira, a gente já deu muita notícia. Mas essa deu mais repercussão. Para quem não me conhecia: muito prazer, Marcelo Bechler. Prazer, Esporte Interativo. A gente faz jornalismo também”.

Bastidores do furo

A curiosidade geral é: como ele conseguiu a informação? O processo não foi fácil, mas foi simples. E ele garante que uma hora ou outra qualquer um conseguiria. Por isso, o que o mais o deixa orgulhoso não é a informação em si, mas sim a forma como ele conduziu o processo e continuou em cima da notícia até a concretização do negócio.

Na segunda-feira (17), os rumores de uma saída de Neymar já pipocavam em Barcelona quando ele acionou uma fonte no Brasil que confirmou a transferência e deu detalhes de toda a história. Bechler foi cauteloso e quis conversar com mais três fontes de Paris e Barcelona antes de divulgar a notícia.

“Liguei, mandei mensagens e uma das pessoas: cara.. está feito. O Neymar vai para o PSG. Me conta tudo. Se você quiser dar, você dá, mas você vai sofrer por 15 dias. Ele vai negar, todo mundo vai te chamar de mentiroso”.

Ele diz que estava tão seguro que só tornou pública cerca de 30% das informações que apurou para não expor os informantes. Segundo ele, quando entrou no ar e anunciou que o negócio estava fechado, estava respaldado por quatro fontes. Na sexta-feira, já tinha 9 e, na quarta, 12. As histórias batiam e se completavam.

Mas ele ainda corria o risco de ver Neymar mudar de ideia e ser convencido a ficar no Barcelona. O único momento de insegurança que viveu foi quando o zagueiro Piqué postou a foto com a legenda “se queda” (ele fica, em espanhol), que parecia anunciar o fim da história com desfecho diferente do que Bechler havia noticiado.

Naquele período, a apuração se tornou mais difícil e as informações, desencontradas. O repórter chegou a ser tratado com rispidez. “Eu ligava e ou as pessoas desligavam na minha cara ou diziam: com você eu não falo. Ou me xingavam. Eu ligava: Oi, tudo bem?. Quem? Marcelo Bechler, com você eu não tenho nada para falar. Você já tem tudo o que precisa. Não me procura. E desliga”.

Depois que Piqué foi à coletiva dizer que a emblemática legenda era apenas um desejo pessoal, o processo ficou mais tranquilo. Mas a situação ainda se prolongou com dias longos, noites em claro e uma perseguição incessante a qualquer coisa que se apresentasse minimamente como pista.

Marcelo abriu mão de muitas horas de sono, por exemplo, para fiscalizar os advogados de Neymar pelo WhatsApp. Entrava de madrugada no aplicativo de conversas apenas para ver a última visualização e se certificar de que eles provavelmente estavam em Paris por causa do fuso europeu. Também fez plantão por uma semana inteira em um local, enquanto as reuniões aconteciam em outro. Ainda ligou para quase todos os hotéis 5 estrelas de Paris para saber se os advogados estavam hospedados lá.

Algumas tentativas deram errado, outras certo. Foi também na base da raça que ele descobriu que Neymar viajaria para a China para cumprir compromissos profissionais e que esse era o motivo do silêncio do atleta. Uma informação que ele considera bem relevante na história.

Bechler não dormiu nem mesmo depois do anúncio quando soube que teria que viajar a França para a apresentação do craque. Ficou ao vivo na TV até às 2h e assim que se desconectou, foi arrumar a casa e lavar roupa para pegar um voo às 4h para Paris. Ainda está na cidade à espera da estreia do atacante, mas as notícias de que Neymar pode demorar ainda para entrar em campo por questões burocráticas não o animam muito: “Estou exausto”. Ele só quer voltar para casa e desligar o telefone.

Foto: retirada do portal UOL

 

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