O Rogério Ceni são-paulino roxo agora enfrenta o time do pai no estádio em que aprendeu a ver futebol

O Rogério Ceni são-paulino roxo agora enfrenta o time do pai no estádio em que aprendeu a ver futebol

Guilherme Palenzuela

Do UOL, em São Paulo

Benítez; João Carlos, Mauro Pastor, Mauro Galvão e Claúdio Mineiro; Batista, Falcão e Jair; Valdomiro, Bira e Mário Sérgio. Rogério Ceni tinha seis anos de idade quando viu pela primeira vez, das arquibancadas do Beira-Rio, um time profissional entrar em campo. Era o Internacional treinado por Ênio Andrade, no dia 16 de dezembro de 1979, time de coração de seu pai Eurydes, que viajara de Pato Branco, no Paraná, a Porto Alegre, para mostrar aos três filhos o Colorado avançar à final do Campeonato Brasileiro ao superar o Palmeiras. O mais novo, Rogério, trajava as cores do Inter dos pés à cabeça. Nesta quarta-feira, quase 35 anos depois, o filho de Eurydes joga provavelmente pela última vez no Beira-Rio antes de se aposentar. Estádio que, longe do Morumbi, começou a escrever a história de Rogério Ceni ao ensiná-lo o que era o futebol.

"Nós fomos com os três filhos, ele é o caçula, tinha 6 anos. Fomos todos, era o jogo pelo Campeonato Brasileiro, contra o Palmeiras. Foi quando o Inter se sagrou tricampeão brasileiro", conta Eurydes Ceni, que uniformizou o filho com as cores do time. "Sim, foi isso mesmo. Porque eu sou gaúcho. E o gaúcho ou é gremista ou é colorado. Eu sou colorado. Meus filhos, até então, eram todos colorados. Rogério, até ir para o São Paulo, era colorado. Hoje é são-paulino roxo", relata o pai, que se mudou para Pato Branco aos 20 anos. "Todos nós ficamos impressionados. Estádio lotadíssimo, emoção ali é grande. A agitação da arquibancada, as pessoas entusiasmadas...", lembra.

O Rogério Ceni são-paulino roxo agora enfrenta o time do pai no estádio em que aprendeu a ver futebol, e no qual já vestiu as cores do adversário. O jogo desta quarta-feira, entre São Paulo e Internacional, às 22h, é válido pela 16ª rodada do Brasileirão, e coloca o time de Muricy Ramalho à prova frente a um verdadeiro desafio. O adversário, treinado por Abel Braga, é vice-líder do campeonato e venceu as últimas cinco partidas. É teste para Rogério, também. Aos 41 anos, viveu os últimos meses exposto por uma defesa que apresenta problemas graves, proporciona chances aos adversários e deixa o próprio goleiro em evidência. Nada disso tem sabor de novidade, no entanto. No 24º ano da carreira, agora cada dia na vida de Rogério Ceni entra para a contagem regressiva, que se encerrará no início de dezembro.

Contagem regressiva que, além do motivo óbvio, também envolve o Internacional no caso de Eurydes Ceni. Seu filho é o maior ídolo da história do São Paulo, de forma incontestável, atingiu todos os objetivos que poderia atingir pelo clube, virou uma das maiores figuras da história do futebol brasileiro e ainda se marcou como o maior goleador de todos os tempos jogando na posição em que se evita o gol, e não o contrário. Mas isso e nem os 24 anos de carreira apagam a devoção do pai pelo Internacional.

"Eu não posso torcer contra o São Paulo. É com uma dor no coração... tenho que torcer contra o Inter", lamenta o pai do goleiro, divertindo-se com o dilema de tantos anos seguidos. Mas é pela última vez. Como já confirmou Rogério, a aposentadoria será decretada ao fim desta temporada. O assunto, segundo o pai, já é tratado com naturalidade, diferente do que acontecia há um ano. Rogério quer viver período de estudos fora do Brasil para se preparar para prosseguir a carreira no futebol como treinador.

"Tenho conversado, ele realmente está decidido a parar. Decidiu que vai parar. Ele quer estudar lá fora, aprender inglês e espanhol, quer se preparar bem antes de qualquer coisa. O próprio presidente do São Paulo foi quem o convidou para fazer esse estágio lá fora", conta Eurydes Ceni.

A história entre o Beira-Rio e Rogério se cruza de forma marcante em 2005 e em 2006, na final da Copa Libertadores da América. No primeiro ano, o estádio recebeu a partida entre Atlético-PR e São Paulo, primeira da decisão, após o veto à Arena da Baixada – que até hoje sustenta a rivalidade entre os clubes. O São Paulo empatou na casa colorada e goleou no Morumbi: Ceni conquistou aquilo que foi moldado a conquistar, aquilo que viu ainda jovem o time de Telê Santana vencer duas vezes. Entrou de forma absoluta para a galera de ídolos. No ano seguinte, história diferente. Rogério tinha vencido o Mundial como herói, com atuação impressionante e vivia a melhor fase da carreira, fazendo gols sem parar. Já era o maior ídolo da história do São Paulo. Na final da Libertadores de 2006, o mesmo Beira-Rio, dessa vez contra o Internacional que ele aprendeu a gostar quando mais jovem. Viu o São Paulo ser derrotado no Morumbi. Em Porto Alegre, vestindo azul claro (foto), falhou: Jorge Wagner cobrou falta de longe, da lateral direita do campo e mandou para a área, direto nas mãos do goleiro são-paulino. A defesa, que deveria ser fácil, não aconteceu. Rogério soltou a bola e Fernandão abriu o placar. O jogo acabou com placar de 2 a 2, e deu o título ao clube gaúcho.

Por ironia do destino, aquele time do Inter que o pequeno Rogério viu no Beira-Rio superou o Palmeiras de Telê Santana, com quem ele trabalharia anos depois, que o faria cruzar o caminho do pupilo Muricy Ramalho, primeiro técnico que permitiria que o goleiro cobrasse faltas.

O jogo desta quarta-feira só não marca a despedida de Rogério Ceni do Beira-Rio caso São Paulo e Internacional se encontrem na Copa Sul-Americana. Em 1979, o menino que viria a ser goleiro do São Paulo viu o Internacional que seria tricampeão brasileiro. Hoje, 35 anos depois, tenta impedir que o mesmo clube, com outro time, mas no mesmo Beira-Rio, seja tetracampeão.

A partida também serve para que Rogério tente desempatar a seu favor o próprio retrospecto no estádio. Desde 1998, ele jogou 13 partidas no Beira-Rio: venceu cinco, empatou três e perdeu outras cinco. O time de Muricy terá os desfalques de Souza, suspenso; Luis Fabiano, Maicon, Douglas, Antonio Carlos e Rodrigo Caio, machucados; e Auro, Lucão e Boschilia, na seleção sub-20.

RETROSPECTO DE ROGÉRIO CENI NO BEIRA-RIO:

05.08.1998 Internacional 0 X 3 São Paulo – Campeonato Brasileiro
07.11.2001 Internacional 1 X 4 São Paulo – Campeonato Brasileiro
24.08.2002 Internacional 2 X 2 São Paulo – Campeonato Brasileiro
06.07.2005 Atlético-PR 1 X 1 São Paulo – Libertadores
17.08.2005 Internacional 2 X 1 São Paulo – Sul-Americana
05.10.2005 Internacional 3 X 0 São Paulo – Campeonato Brasileiro
14.05.2006 Internacional 3 X 1 São Paulo – Campeonato Brasileiro
16.08.2006 Internacional 2 X 2 São Paulo – Libertadores
30.09.2007 Internacional 1 X 2 São Paulo – Campeonato Brasileiro
23.07.2008 Internacional 2 X 0 São Paulo – Campeonato Brasileiro
23.05.2010 Internacional 0 X 2 São Paulo – Campeonato Brasileiro
28.07.2010 Internacional 1 X 0 São Paulo – Libertadores
17.07.2011 Internacional 0 X 3 São Paulo – Campeonato Brasileiro

FICHA TÉCNICA
INTERNACIONAL x SÃO PAULO

Local: Beira-Rio, em Porto Alegre (RS)
Data: 20 de agosto de 2014, quarta-feira
Horário: 22h (de Brasília)
Árbitro: Grazianni Maciel Rocha – RJ (CBF-1)
Assistentes: Dibert Pedrosa Moisés e Michael Correa (ambos do RJ)

INTERNACIONAL: Dida; Wellington Silva (Cláudio Winck), Ernando, Juan e Fabrício; Ygor, Aránguiz, Alex, Alan Patrick (Jorge Henrique) e D'Alessandro; Rafael Moura
Técnico: Abel Braga

SÃO PAULO: Rogério Ceni; Paulo Miranda, Rafael Toloi, Edson Silva e Alvaro Pereira; Denilson, Hudon, Kaká e Ganso; Alexandre Pato e Alan Kardec
Técnico: Muricy Ramalho

Foto: UOL

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